Alberto Viana d'Almeida
29abr2007
Lembra, querido? Parece mentira que caminhávamos pelas ruas de sempre como se fora a primeira vez. Dos dias quentes em que sentávamos debaixo das árvores em praças favoritas e você me lia Balzac para que eu embasbacasse de te ouvir sussurrar o elixir da longa vida, e deixávamos Don Juan para que pudéssemos viver de instantes? Lembra? Sim senhora, uísque. Você achou curiosa essa minha cicatriz na testa, como maior evidência de miolos moles, disse-me, com esse sotaque ainda coalhado dos tempos da Itália. Divertia-me com seus pequenos desastres diários, os tropeços mais charmosos eram os seus, porque depois deles, você olhava de esgueira, aguardando rubramente pelos meus risos já desculpados de antes. Assim que costumávamos, às terças, assistir aos filmes raros e aproveitávamos como meninos ainda as pipocas servidas no decorrer das sessões. Eram salgadas em demasia, acorda-te? A senhora aceita mais uma dose? Mas era por isso mesmo que brigávamos até os últimos milhos para que nossas salivas pudessem ser mais bem aproveitadas em tempo de beijo. Recordo-me agora como é bom quando cerveja e nicotina misturam-se às línguas. Ainda guardo nossos passeios. Parece mentira que estamos aqui agora, depois de tanto tempo juntos, vivendo uma vida de sonhos. Hein, meu rapazinho! Ok, essa é por conta da casa. Ahh...é! Lembra das noites em que nas voltas para a casa, você cuidava de deixar-me, primeiramente, no terminal porque eu mal sabia andar com minhas próprias pernas — desobedientes que insistiam em movimentos flagrantes de que eu não saberia mais caminhar se não fosse às alturas contigo —, depois, na de meus pais? À contragosto você se aproximava, tão avesso aos laços. E nossos redemoinhos emocionais não nos deixavam cair das nuvens, loucos de palavras. Quase. E cantávamos algo de cordel, talvez pelo fogo encantado que viveríamos quando seu corpo, na medida exata, encostasse ao meu, porque era como um menino que me gritava colo. Eu protegia-te inteira e precisava de você frágil quando me amava, todo sem forças, suado de perder-se entre meus cabelos que se enroscavam na sua barba. Gostava do atrevimento e da sua falta de controle e de quando falávamos muito. Peça-me e a levarei. Assim foi, lembra? Levas-te-me...no esquecimento dos olhos claros demais. Lembra? Senhora, o bar já está fechando. Precisa de algo? Não obrigada, é que o vento — instante que acena quando passa — lambeu-me inteira e meu corpo vibra descompassado, em meio aos seus segredos gelados que insistem em atacar os notívagos solitários, rascunhados em quinas olvidadas com seus pedaços amargos de lado esquerdo. Assim que, poeticamente embaraçada, vou esmiuçando o que mora em mim em horas de partos silenciosos que gritam do útero primeiro....meu ventre meus ventos. Ai ai!! Desmoro/nada! adivinho meus escombros... caí em meu precipício de en(fim)...mentira vermelha que escorre ainda quente e mistura-se aos pêlos daquela barba atrevida de não rimar. Assim que desemboca em sumiço salgado...e eu alcoólica inteira de re/partida verdade, quase doce. Enjôo.
24/04/2007
03:00h
03:00h
Parabéns, muito bom o texto. Poético demais.
ResponderExcluirMuito bom, quase um goethe, meus parabens...
ResponderExcluirUau!
ResponderExcluirDos deuses!
ResponderExcluir:)
Hmm. Bela construção. Per favore continue escrevendo. ;-)
ResponderExcluirjá conto com esse texto para meus primeiros passos para a escrita feminina..
ResponderExcluirBom.
Delícia de prosa feminina!Impressionante como a gente, como mulher, consegue esmiuçar as emoções e condensá-las em palavras!
ResponderExcluirAprecio muito seu blog,muito gostoso de ler... tanto que adicionei-o em meus favoritos.
Seja sempre bem vinda!
Adorei o texto
ResponderExcluirparabens
nostalgia...
ÓTIMO TEXTO, ME VI PARTE DA HISTÓRIA. SERÁ QUE SOMOS NÓS OS PROTAGONISTAS?
ResponderExcluirBia! Bia! Bia!
ResponderExcluirque demais.
senti um ligeiro bem-estar-de-amor que não sei dizer o que significa.
Achei tão lindo, poético, tocante e carivo.
Parabéns!
Beijo-te, querida!
Oh! Estupendo, de mais, incrível! E bla bla blá (...).
ResponderExcluirBem, dadas às gratificações iniciais repletas de exagero infantil, ou de quem faz pouco caso devo dizer-te que estou feliz após ler seu texto. Talvez feliz não seja a palavra certa, surpreso eu diria. Melhor: Surpreso e feliz.
Gostei muito da leitura que me proporcionastes! Logo após eu ter escrito algo, ouvindo Zeca Baleiro e sentindo ainda um pouco da aflição que continha antes de organizar sentimentos, sensação essa que geralmente acaba logo que escrevo, mas desta vez insistiu.
Insistiu porem, somente até o momento em que li esse texto em seu blog.
Eu precisava disso, exatamente disso! Uma leitura com que eu me deleitasse repleta de artifícios que eu adoro.
Agora sim é feita a vez dos comentários não muito pertinentes, mas a que motiva a escrever, ou não. Gostei dos cenários, das descrições dos personagens elaboradas através de suas ações, texto encantador. Li sem notar que a canção que ouvia acabará...
Texto perfeito!!!totalmente visceral!!viajei,delirei...amei.Só um pedido..Não deixa de escrever...Nunca.
ResponderExcluirBeijos,
Lady Vania de Tróia.
oi...
ResponderExcluirtambem souy convidado da revista lasanha, li lah o seu texto... simplesmente lindo, ou muito foda na minha linguagem, rs, me indentifiquei muito, trouxe muitas boas e engraçadas lembranças... muito bom... parabens e prazer...
"...redemoinhos emocionais..."
ResponderExcluirSempre em mil movimentos e vozes, veludosas, lentas ou velozes, tua linda alma, Linda!...
Eu, ando devagar, voando entre luas, farelos de estrelas e letras... ou seriam migalhas de sonhos, restos de desejos rosados, a transitar e flutuar dentro de mim, nestas noites de maio?...
Deixo beijos, alados.
Espetacular, impossível parar de ler!
ResponderExcluirPoutzz..muito bom. Bom demais mesmo!
ResponderExcluirFazia tempo que não encontrava uma leitura tão agradável...
Vou guardar seu espaço pra ler mais
Até mais!
Bom re-pousar por aqui, re-ler-te, e revolver tuas cores e linhas fluidas, vivas, pulsantes!... Um bando de beijinhos alados, Linda!
ResponderExcluirFantático teu blog.. parabéns. Muitos textos incríveis. Estou comentando neste por ser o último, mas gostei de alguns outros particularmente...rs.
ResponderExcluirUm grande abraço, parabéns novamente pelo teu talento.
oi biá! ^^
ResponderExcluirnossa. cara, esse negócio de amor é uma coisa louca que encanta todo reino animal e alguns do vegetal.
como pode? como? é uma coisa meio descontrolada... mas é bão... ^^
?
vc esperava estar grávida, é? O.O
^^
bjooss!
Uma delícia para ler; uma carícia na alma feminina.
ResponderExcluirOi querida! Já tava com saudades. Parabéns! Não me canso! :) Beijocas!!
ResponderExcluirParece mentira, querida Beatriz. Dizem que os ogros cortaram as barbas. Já não caminham pelas praças de catedrais modernas. Seus cabelos são curtos e (após muito lerem Balzac) desistiram dos livros e nunca mais apontaram um lápis sequer. Dia destes, o Balzac me achou sete vezes no mesmo dia, mas quem o havia feito era apenas o Rodin. Beijos!
ResponderExcluir