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quarta-feira, 6 de junho de 2007

Não me olha assim

E eu, já agora, quero-me-interrogação
Mariah - 14abr2007


Ver é retratar com gratuidade os instantes. Lentes faiscando imagens de desejos queimantes de peles. Não há percepção alheia, nenhum significado transbordou. Às vezes paravam e flutuavam sobre o chão — distraídos — dissimulando convencer o estacionamento do tempo. Renderam-se. Escalaram lentamente sua esfera, alcançaram a altura ideal ao magnetismo — o vício oftalmológico é grudar-se no olho do outro — e começaram a se desestruturar. Talvez a sedução tenha madrugado. Bocas sempre na perfeita ocasião, requebrando-se num ritmo encantatório que acompanha a mordida. Fortes rompantes, vísceras retorcidas. O perturbador samba atravessou por onde os nervos desfilavam, rotas fantasias. Obscuridades. Um aborto aos entreolhos ocasionou a desengrenagem ocular, a divergência panorâmica. E o espelho traiu o portador, apontando-lhe um estilhaço. Cegueira. Inflamou-se a união, a conjuntura. Conjuntiva. Água salgada em derrame. Desvios, veias opostas, vias díspares reinando no contato. Paralelos foram os ritmos da sinfonia que não proporcionou o convite aos novos passos. Tropeços marcaram a última seqüência de gestos. Olhos medrosos procurando desvencilhar-se da luz conhecida que percebe o de dentro do outro. Ninguém mais quis se ver. Temeridade de areia movediça, cerceando movimentos cerebrais e atingindo camadas secretas, gavetas trancadas...será que o descobrimento da chave — deciframento de códigos — nomearia a rainha? angústia da aproximação. Mas não há outra fórmula para o olhar senão a penetração, não há como segurá-lo, impedi-lo da invasão. Centrífuga de pulsações. Medusiano processo do avistamento que empedra o que é fluido, estatuando a maleabilidade inerente à população que sobrevive em estados anônimos. Desnomeado, desimportante, oco de si, de mim, de dó. Sem conhecer-se. Desperdícios. Descuido humano. Quem olha, pega algo sem permissão. No sustenido de uma nota, cômicos foram os grandes saltos, dribles de rabo de olho, sobremirada em sapatos, sandálias e pés descalços, bloqueando o 43, que escorria pelos furos da defesa. Olha só, olhos que somem, olhos que só mentem, somente olham e desolham...aqueceram-lhes novos sóis. Claves maiores... Ponto de vista em pontos de ebulição. Ainda caminha nos desertos gelados a vaidade. Resquícios de poeira e umbigo. A falta embaça. Um terçol resta-lhe. Como uma águia, foi sua presa de vidro. Ardência ainda na pálpebra. Mas...como ver?

2 comentários:

  1. um conto erótico?! um estranhamento me passa aqui. sensação difusa entre desejo. ver. e em tempos de webcam, o erotismo desse olhar q vc descreve aí "Mas não há outra fórmula para o olhar senão a penetração, não há como segurá-lo, impedi-lo da invasão"... céus!!! é todo. o fetiche. voyerismo e completude. muito bom, minha clarice internáutica!

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  2. asmiravelmente profundo
    ...sensivelmente belo...
    parabéns.

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